Numa roda composta apenas por mulheres, Instituto Humanitas360 aborda o tema do encarceramento feminino em seminário promovido pela Folha de São Paulo
No último dia 15 de outubro o instituto Humanitas360 lançou o documentário Tecendo a Liberdade. O filme conta histórias de luta e superação das integrantes da COOSTAFE (Cooperativa Social de Trabalho Arte Feminina Empreendedora), primeira cooperativa de mulheres presas do Brasil, formada em 2014 no Centro de Reeducação Feminino de Ananindeua (CRF), em Belém (PA) e da Cooperativa Lili, implementada pelo H360 na Penitenciária Feminina II de Tremembé (SP). Para marcar o lançamento do filme o H360 promoveu, em parceria com o jornal Folha de São Paulo, o seminário virtual Encarceramento Feminino. O debate foi mediado pela repórter especial da Folha Fernanda Mena e contou com a presença da diretora e roteirista do filme Luíza Matravolgyi, a diretora do IDDD Marina Dias (que também dá seu depoimento no filme), a presidente do Instituto Humanitas360 Patrícia Villela Marino e a cantora, atriz e ativista pelo direito à moradia Preta Ferreira.
A conversa tratou da realidade do encarceramento feminino, das causa e consequências para estas mulheres, suas famílias e, portanto, para a sociedade brasileira. Em sua fala, Marina Dias menciona a importância de reunir mulheres comprometidas com a transformação da realidade prisional e da quebra do ciclo de violência que se perpetua e resulta no encarceramento em massa. “O encarceramento das mulheres é a última etapa da sofisticação da violência de gênero. Isso se revela pelo Judiciário, com decisões moralistas, pela violência policial quando presas, pelo abandono da família no cumprimento de pena”, disse.
Luíza disse que encerrar o documentário foi um desafio pessoal, especialmente por entender que são histórias que não se encerram com o filme: “a história das cooperativas continua acontecendo, o Humanitas360 continua trabalhando na construção das cooperativas como a do Maranhão. Foi uma decisão encerrar para que a gente pudesse fazer esta história rodar, comunicar às pessoas”. A diretora vê o filme com uma ferramenta de ativismo que fomenta o debate na busca de soluções possíveis para esta questão.
Para Patrícia Villela Marino, o filme representa um esforço do H360 em visibilizar as injustiça social e inequidade racial que vivemos no Brasil e da constituição de vínculos. Segundo Patrícia, “Há necessidade de vínculos para sermos uma sociedade humana, reconciliadora. É disto que se trata este documentário: a constituição de vínculos entre nós, as mulheres presas, as agentes penitenciárias”.
Preta Ferreira, que esteve 108 dias em prisão provisória, lembrou dos aumento de 500% no número de mulheres presas nos últimos 10 anos e da falta de políticas públicas voltadas às populações mais vulneráveis. “Precisamos nos perguntar porque estas mulheres estão sendo presas e qual é a parcela de culpa da sociedade. Como reinserir em sociedade quem nunca foi inserido? A gente precisa falar sobre necropolítica numa linguagem simples e acessível”, disse Preta.
Há, no filme, uma cena em que uma das mulheres presas é liberta. A cena causou um forte impacto entre as participantes do debate. “Eu vi aquela cena umas dez vezes. Vocês não tem noção de como é receber aquela liberdade, ver aquelas mulheres presas comemorando a saída de uma companheira mesmo sabendo que vão continuar alí”, disse Preta.
A relação da Lei de Drogas e o amplo encarceramento de mulheres sob decorrência do porte de drogas – muitas delas, inclusive, presas com pequenas quantidades – foi levantada no debate. Na última década, o número de mulheres presas aumentou mais de 500%. Mais de 75% das mulheres presas cometeram crimes sem violência, 64% respondem pelo crime de tráfico de drogas,63,5% das mulheres presas no país são negras, quase a metade delas tem menos de 29 anos, 74% delas são mães – boa parte de mais de uma criança.