Novo estudo reforça que pontos fracos do Brasil em relação à democracia estão associados à cultura política dos cidadãos

Novo estudo reforça que pontos fracos do Brasil em relação à democracia estão associados à cultura política dos cidadãos

Um estudo lançado pelo Insituto Sivis no final de 2019 revelou aspectos interessantes sobre a participação cidadã no município de São Paulo. A partir de entrevistas com especialistas e com mais de 2400 residentes na capital paulista, o Índice de Democracia Local mapeou cinco dimensões do estado da democracia na cidade: cultura democrática, participação política, funcionamento do governo local, liberdades e direitos e o processo eleitoral. Alguns dos indicadores que mais saltam aos olhos no estudo revelam convergências com o Índice de Engajamento Cidadão, trabalho comparativo lançado pelo Humanitas360 em parceria com a The Economist Intelligence Unit (EIU) em 2018, com dados do ano anterior.

São trabalhos feitos com metodologias diferentes: o estudo mais recente está baseado em survey e entrevistas, em proporções representativas, com margem de erro de 2% a um nível de confiança de 95% e diz respeito apenas à capital paulista. Já a pesquisa feita em 2017 partiu de dados secundários para analisar três aspectos do empoderamento cidadão em sete países América Latina: Estados Unidos, Colômbia, Chile, México, Brasil, Guatemala, Venezuela. São eles: as condições garantidas pelos países analisados para garantir o exercício dos direitos cidadãos; o estado do empoderamento cidadão (verificado através de passeatas, mobilizações civis, petições, etc); e, por fim, a percepção, pela própria população, do seu empoderamento. 

Dadas essas diferenças fundamentais, vale um exercício de aproximação entre os estudos, à medida em que eles se aproximam em pontos importantes. O estudo de 2018 já mostrava que o nível de confiança no governo, em todos os países analisados, exceto os EUA, era muito baixo – algo que o trabalho mais recente com a população de São Paulo corrobora: os partidos políticos são as instituições em que o paulistano menos confia. A porcentagem de confiança da população – que chega a 42% com as Forças Armadas e a 34% com a Polícia – é de 5,8% entre os partidos políticos. 

Para a gestora de pesquisa e impacto do Instituto Sivis, Thaíse Kemer, e a pesquisadora da instituição, Camila Pessoa, os resultados dos dois estudos estão alinhados. “O Índice do Engajamento Cidadão também evidencia que os principais pontos fracos da democracia brasileira não estão exatamente no arcabouço institucional – ainda que ele mereça aprimoramentos em alguns pontos –, mas em aspectos associados a manifestações da cultura política dos cidadãos.”

O Brasil foi identificado, no Índice de Engajamento Cidadão, como o país que tem menor percepção de seu poder cívico – apesar de dados mostrarem sólidas instituições democráticas e condições razoáveis de empoderamento cidadão. Já o estudo do Instituto Sivis mostra que, na população paulistana, há um baixo nível de confiança interpessoal: 80,7% dizem confiar em suas famílias; 36,8% em seus conhecidos, 23,4% nos vizinhos. A confiança em desconhecidos não chega a 5%, o que demonstra um ambiente pouco frutífero para discussões políticas. 

“A princípio, não é um problema por si só que os cidadãos desconfiem dos representantes ou de instituições que os representam”, lembram Kemer e Pessoa. “O que desperta maior preocupação, no caso do Índice de Democracia Local, é que existe certa associação entre níveis razoáveis de confiança no sistema político e apoio à democracia. Então, o maior problema é que a desconfiança em partidos e em outras instituições anda, em alguma medida, em conjunto com um sentimento antidemocrático, o que pode contribuir para a erosão do regime.”

O interessante destes dois estudos é o apontamento de lacunas e espaços nos quais a sociedade civil pode atuar. O próprio Índice de Democracia Local mostra, por exemplo, que os cidadãos que têm um mínimo conhecimento ou que passaram por formações básicas sobre política, se interessam e engajam-se mais do que os que desconhecem funções básicas do Estado. É claro que os estudos se correlacionam também com índices de desigualdade – de renda e de acesso à educação, por exemplo – que estão ligados à propensão das pessoas a participarem de atividades democráticas e exercerem seus direitos. Convidamos todos a conhecerem melhor os trabalhos dos dois índices pelos links abaixo:

Índice de Democracia Local – São Paulo (2019), produzido pelo Instituto Sivis
Índice de Engajamento Cidadão (2018), produzido pelo H360 + The Economist Intelligence Unit (EIU)